UOL Viagem

09/07/2009 - 06h57

Dubai, nos Emirados Árabes Unidos, é a extravagância do turismo gastronômico

SETH SHERWOOD
New York Times Syndicate
A banda estava tocando um pop árabe improvisado, a dançarina de dança do ventre estava rodopiando furiosamente e os freqüentadores agitados do restaurante estavam dançando e batendo palmas enquanto o garçom servia o último prato da minha refeição - o 12º de acordo com a minha contagem - em meio aos escombros do meu banquete.
  • Tamara Abdul Hadi/NYT

    Os complexos ensopados chamados tagines podem ser saboreados no restaurante Almaz by Momo, como nesta versão de cafta com ovo


Diversidade Culinária

Em meio à fumaça do narguilé eu percebi um enorme prato de frutas. Ao redor dele se encontravam os restos de um homus oleoso, linguiças saborosas com sumo de limão e outras iguarias libanesas. Inchado do banquete, eu me senti como um sultão corrupto governando meu império decadente.

Naquele momento, a sede do império era Al Qasr, um animado restaurante libanês no Dubai Marine Beach Resort and Spa (Jumeirah Beach Road; 971-4-346-1111; www.dxbmarine.com) com um jantar por preço fixo (220 ou 250 dirhans, ou cerca de US$ 58 ou US$ 66, com o dólar cotado a 3,80 dirhans) contendo comida quase ilimitada.

O momento foi um final adequado para minha odisséia pelo cenário culinário de Dubai, uma cidade-Estado livre que se tornou sinônimo de excesso glorioso. Apesar de a crise econômica internacional ter atingido as torres de escritórios, mercados financeiros e canteiros de obras de Dubai como uma tempestade de areia, uma visita em janeiro de 2009 encontrou a ampla cena de restaurantes notavelmente intacta.

Ao longo de três dias, eu provei uma variedade de culinárias, desde o Norte da África até o subcontinente asiático. Para os devotos da comida do mundo árabe-islâmico, Dubai pode oferecer o maior e mais concentrado bufê no planeta.

Credite a diversidade culinária à população cosmopolita de Dubai. Juntamente com o grande número de ocidentais e indianos, os estrangeiros de países muçulmanos - as tripulações das companhias aéreas marroquinas, os comerciantes iranianos, trabalhadores paquistaneses, os bilionários kuaitianos - buscaram oportunidades durante o boom de Dubai, trazendo sua cozinha regional consigo ao mesmo tempo em que transformavam o emirado na Manhattan do Oriente Médio. Um grande contingente de libaneses - cristãos e muçulmanos - também deixou sua marca em Dubai e suas opções gastronômicas.

O resultado é um mercado de alimentos por toda a cidade no qual restaurantes, tanto simples quanto de luxo, que servem mezzes semelhantes a tapas, berinjelas excelentes, cuscuz leve, coalhadas aromáticas, infinitos kebabs, carnes cozidas com fruta, o forte aguardente arak e sobremesas banhadas em mel. Tudo o que você precisa é um táxi e um amor por condimentos.

Após uma dessas viagens de táxi, eu encontrei temperaturas congelantes e neve ao anoitecer no Mall of the Emirates - pelo menos na única rampa de esqui indoor do Oriente Médio. Mas o clima dentro do Almaz by Momo (que fica dentro da loja Harvey Nichols no shopping; 971-4-409-8877; www.altayer.com/companies/food/almazbymomo), um sensual restaurante marroquino, foi puro calor norte-africano: lanternas bojudas laranjas, cadeiras felpudas cor de pistache, música dançante argelina.

Poucos restaurantes de Dubai oferecem um pedigree tão impressionante. O restaurante é uma criação de Mourad Mazouz, o homem por trás de pontos badalados londrinos como o Momo e Sketch. (Estrangeiros não podem ser proprietários de negócios em Dubai, mas Mazouz, um argelino - o "Momo" no nome - foi contratado para criar o conceito e administrar o restaurante.) E com estilo radiando de cada canto, a pergunta surge naturalmente: a cozinha está à altura da decoração?

As azeitonas vermelhas, marinadas em patê de tomate e azeite de oliva, foram imediatamente devoradas por minha amiga Yasmin, uma marchande nascida na Síria e criada em Dubai. Eu considerei isso um forte endosso. Nossos aperitivos, entretanto, provaram alternar sucessos e fracassos. A salada chamada mechouia (20 dirhans) daqui era uma pasta com pedaços grossos feita de tomates levemente grelhados e pimentas, mas causando indiferença na língua. Melhor foi a zalouk (22 dirhans), uma pasta semelhante à base de berinjela, muito mais saborosa e de encher a boca.

A melhor medição de um restaurante marroquino são seus tagines, os complexos ensopados que frequentemente misturam todos os ingredientes presentes na pia da cozinha, de carnes e frutas a molhos. Nós escolhemos uma versão bem simples - cafta com ovo (65 dirhans) - que atingiu perfeitamente o alvo. O cafta era levemente condimentado e complementado perfeitamente pela cobertura suave de ovo e molho de tomate espesso.

Mas nosso cuscuz Almaz (75 dirhans) foi uma decepção. A linguiça merguez que o acompanhava, que pretendia ser condimentada e suculenta, era seca e dura. Os pedaços de cabrito grelhado lembravam uma borracha marinada. Felizmente, o chá de hortelã (25 dirhans) e os doces de pistache-mel-amêndoa (10 dirhans) que arremataram nossa refeição teriam agradado em Marrakech.

No geral, nosso jantar pareceu um ziguezague entre pratos bons e medíocres. Mesmo assim, se você conseguir se esquivar das armadilhas, é possível ter uma refeição satisfatória e cheia de estilo.
  • Tamara Abdul Hadi/NYT

    No sensual restaurante marroquino Almaz by Momo, decorado com lanternas bojudas laranjas, é possível escolher entre pratos bons e medíocres


Persa clássica e cozinha levantina

Estilo estava em falta no Shabestan no Radisson SAS Hotel (Dubai Diera Creek; 971-4-222-7171; www.deiracreek.dubai.radissonsas.com). Neste restaurante persa de luxo, uma trilha sonora de pop com sintetizadores dos anos 80 era rivalizada em breguice apenas pelos tapetes berrantes estilo anos 70.

Ainda assim, a decoração desestimulante não dissuadia os clientes - empresários sul-africanos, famílias abastadas de língua árabe - de saborearem o baghalah polo-ba-mahichech (perna de cabrito assada com fava e condimentos; 109 dirhans) e kebabs de carne marinados em vários iogurtes.

A culinária persa clássica é célebre por sua mistura de carnes com frutas como pêssegos, cerejas e limas, de forma que pedi um fesenjan-ba-morgh - frango com molho de romã (95 dirhans) - e matei o pão chato quente enquanto aguardava.

Quando o caldeirão chegou, a mistura roxa espessa e em pedaços tinha uma consistência que mais lembrava um cimento quente do que um ensopado. Mas o sabor era excelente. A carne era suculenta, como se tivesse sido assada por horas, e o molho de romã apresentava uma rica mistura agridoce. Uma porção de arroz basmati de grãos longos - com um exterior altamente crocante que os iranianos apreciam - fornecia a base.

Mais surpreendente, entretanto, foi o prato final, que provou que a distância entre Oriente e Ocidente pode ser medida por um fio de macarrão.

Segundo o método italiano, os ocidentais fervem o vermicelli, o cobrem com molho e o servem como prato principal quente. Mas a coda da minha refeição, o faloodeh (45 dirhans), vira de cabeça para baixo esta prática ocidental.

Esta massa a la Pérsia foi congelada e moldada em uma esfera. Cerimoniosamente, o garçom pegou dois pequenos jarros e despejou seu conteúdo - água de rosa e sumo de limão - na massa. O resultado foi um rápido ataque em múltiplos níveis: um choque cítrico frio e agudo amenizado pela água de rosa adocicada e então suavizada pelo espaguete picado. Eu comecei a planejar uma viagem para Teerã.

"Você está prestes a desfrutar da culinária levantina autenticamente única", anunciava o cardápio do Mezza House (Cidade Velha, Yansoun 9; 971-4-420-5444; www.mezzahouse.com), um novo restaurante chique próximo do quase concluído Burj Dubai, que seus empreendedores alegam já ser o prédio mais alto do mundo. "Nossas especialidades incluem tudo das cozinhas libanesa, palestina, síria e jordaniana."

Um amante da cozinha levantina, eu estava ávido como uma criança no Natal. Minha empolgação aumentou quando soube que o chef era de Aleppo, Síria, um dos meus lugares favoritos. Uma brisa quente soprou pelas janelas. Era um dia perfeito no Golfo Pérsico.

Até tentar fazer o pedido. Não, eles não tinham kebabs com molho de cereja, minha especialidade favorita de Aleppo. ("É muito difícil obter cerejas frescas em Dubai", disse Nasser Zuhour, o proprietário de origem palestina, pedindo desculpas.)

Não, eu não poderia pedir um mansaf petit, um prato palestino-jordaniano envolvendo perna de cabrito assada lentamente sobre uma cama de arroz. ("É preciso pedir com antecedência. É para quatro pessoas.")

E não, não havia vinho sírio ou libanês (as licenças para álcool são normalmente concedidas apenas a hotéis e shopping centers).

Eu podia ouvir o terço árabe de Zuhour clicando entre seus dedos. Educadamente, ele sugeriu que ele mesmo decidiria o que eu deveria provar.

Primeiro veio o fatuche (25 dirhans), uma salada de pepino picado, alface, tomate e pedaços de pão torrado. Um tempero a vinagrete acrescentava uma acidez agradável, enquanto sementes de gergelim e sementes de romã lhe davam doçura. Fresco e levemente picante, ele proporcionava um contraste perfeito ao clima quente de Dubai.

Ele foi seguido por um mezze (45 dirhans) contendo, entre outros itens, homus, que sempre considerei tão sem graça quanto terra. Não desta vez. Batido até uma suavidade impressionante, ele veio com azeite de oliva e iogurte suficiente para acrescentar tanto estímulo quanto vigor.

O prato também incluía outro item levantino quintessencial: o quibe. Feito de carne de cabrito moída em um pilão (ou simplesmente em um processador), o quibe pode sair tão sublime quanto um tartare ou vil quanto carne de hambúrguer crua. Como Tess Mallos escreve em "The Complete Middle East Cookbook", uma das minhas bíblias gastronômicas, "a excelência de uma cozinheira árabe é medida por seu quibe". Este é o momento da verdade.

Dois pratos foram colocados diante de mim. O primeiro continha um quibe puro que era totalmente aveludado e robusto ao mesmo tempo - perfeito. O segundo continha um quibe misturado a condimentos e pedaços de pimenta vermelha. Ele provou ser levemente ardido, com sabor profundo e ainda rico. Aprovado.

O único passo em falso foi um musakhan (50 dirhans), um prato estilo palestino seco e sem inspiração de frango assado sobre pão fino e crocante coberto com cebolas caramelizadas e salsa. Mas um café turco (15 dirhans), como uma onda de piche doce e saboroso sobre a língua, varreu a lembrança e ofereceu um encerramento revigorante.
  • Tamara Abdul Hadi/NYT

    Em meio à fumaça do narguilé o turista pode degustar no Al Qasr um autêntico homus e outras iguarias libanesas


Milho e iguaria peshawari

Na penúltima parada, um restaurante paquistanês chamado Ravi (saindo do Satwa Circle; 971-4-331-5353), a especialidade é a carne de carneiro. Há algo no cardápio chamado "cérebro frito", mas o estudante de carne de carneiro não encontrará melhor curso intensivo do que esta cantina barata. Picado de carneiro, sopa de carneiro, masala de carneiro, curry de carneiro - está tudo ali.

"O que é um carneiro peshawari?" eu perguntei ao garçom.

"Com ossos. Como em Peshawar." Ele parecia entediado com a pergunta.

"E frango peshawari?"

"O mesmo. Como em Peshawar. Eles sempre mantêm os ossos em Peshawar."

Eles sempre mantêm os ossos em Peshawar. A frase ficou ecoando na minha mente quando pedi uma sopa de milho (7 dirhans) e um frango peshawari (15 dirhans), ciente de que isto poderia ser o mais próximo que chegaria da notória cidade paquistanesa próxima da fronteira afegã. Eu precisaria de tempo para digerir as opções de carneiro.

Ao meu redor, dezenas de homens paquistaneses - apenas homens - lotavam as mesas brancas longas ao estilo de cantina, devorando suas refeições com a mão direita. Eles vestiam uniformes de taxistas, túnicas brancas longas e barretes, ou camisas de abotoar de poliéster. As paredes brancas e as lâmpadas fluorescentes fariam uma sala de operação parecer romântica.

Mas, ahhhh, a comida. O garçom, de rosto impassível, serviu a espessa sopa de milho. Ela poderia facilmente ser uma gororoba grudenta e sem sabor, mas reunia tanto vigor quanto textura: o milho e as ervilhas eram firmes, não excessivamente cozidos.

O frango peshawari compreendia vários pedaços de carne que eram, de modo fiel à descrição, ligados por pedaços de ossos. Tudo preparado com óleo e fortes pimentas picadas. Um pequeno movimento com o garfo foi suficiente para separar a carne tenra dos ossos. Salpicada com sumo de limão fresco e enrolada em um quente e suave naan, cada nugget suculento descia suavemente como um wafer.

Para o final, eu optei pelo curry de carneiro (15 dirhans). Os pedaços eram espessos e robustos - uma carne larga, uma resposta proletária ao cabrito. O molho marrom pesado provocava uma queimação lenta e profunda. Após três minutos, meus seios nasais estavam limpos e eu estava à procura de uma nova pilha de guardanapos.

O garçom sorriu pela primeira vez.

"Como está sua comida?" ele perguntou com um sorriso de gato Cheshire. "Picante demais?"

Do lado de fora, homens vestindo camisas de manga comprida conversavam e fumavam enquanto eu esperava por um táxi. Pelo preço da viagem, eu comi desde Casablanca até o Passo de Khyber. No final, os trechos acidentados da estrada culinária foram pequenos em comparação às recompensas banhadas em iogurte, enriquecidas por condimentos e perfeitamente grelhadas.

E naquela noite seria meu encontro com a banda pop árabe e a dançarina de dança do ventre no Al Qasr. Outra noite árabe sedutora me aguardava.

Tradução: George El Khouri Andolfato

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