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Saiba como aproveitar um fim de semana em Melbourne com US$ 100

Seth Kugel

New York Times Syndicate

12/05/2012 07h00

Durante minha tentativa de passar o fim de semana com US$ 100 em Melbourne, a comida me salvou mais de uma vez. No verão passado, Melbourne, a segunda maior cidade australiana, cheia de vida, de graça e superlimpa, foi considerada a melhor cidade para se viver pela Economist Intelligence Unit. Sem dúvida, um chamariz muito mais interessante do que a impressão que eu tinha até então – a da cidade australiana que não tinha um teatro de ópera famoso – e, por isso, achei que valia a tentativa frugal.

Apesar de também ser considerada uma das cidades mais caras do mundo, parece que a pesquisa não levou em consideração que ali é possível comprar um filé de carne de canguru, marinado em molho de ameixa, por oito dólares australianos (quase o mesmo valor em dólares norte-americanos), e grelhá-lo num parque público.

Também fui atraído para Melbourne por uma amiga, Patricia Salazar, que conheci em 2010, quando ela foi convencida a mostrar ao "amigo de um amigo" (no caso, eu) sua cidade na Colômbia, sem saber que eu era jornalista. Depois daquilo, ela se mudou para Melbourne e, sem guardar rancor pelo meu golpe baixo, ofereceu-me seu apartamento porque ia ficar com o namorado, Wes McCarthy. Patricia e Wes me acompanharam no fim de semana, que foi maravilhoso, mas me vi num dilema: como poderia agradecer-lhes a hospedagem e fazê-los arcar com as próprias despesas? (Aqueles US$ 100 – cerca de 96 dólares australianos – cobriam só a minha parte, e olhe lá.)

Pois encontrei a solução na comida – nesse caso, vietnamita, mas depois eu explico.

Sábado
O apartamento da Patricia fica de frente para a estação Flinders Street, uma obra-prima eduardiana complexa em tijolos vermelhos que é o ponto de partida de grande parte do transporte público de Melbourne. Sua beleza ajudou a superar a dor de ter desembolsar 7,60 dólares num passe de transporte diário. (O ótimo sistema integrado de trens e bondes, fácil de entender e bem eficiente, também ajudou a minimizar mais a dor.)

Primeira parada: o Queen Victoria Market, uma feira que vende frutas, legumes, verduras, tranqueiras e comidinhas cinco dias por semana. Gostei do sistema de classificar os produtos por estado: manjericão do norte de Queensland, três dólares o maço; alcachofra de Victoria, três por cinco dólares. Almoçamos na praça de alimentação: eu comi um tipo de calzone no pão sírio por 7,50 dólares e gastei 75 centavos numa pera e uma maçã que guardei para depois. Deixei de lado o prosciutto de canguru, mas não resisti à plaquinha que dizia: "Cangurus nos próximos 5 km"; por um dólar australiano, era o souvenir que eu tinha que levar (havia também versões com o vombate e o coala). Wes comentou que devíamos voltar à barraca ReWine para ganhar o desconto dado a quem devolvesse o vasilhame.

Tenho uma regra rígida, mas simples, para os museus nos meus fins de semana de US$ 100: só visito os que são de graça. Em Melbourne, isso era tarefa fácil e a atividade tomou grande parte da nossa tarde graças às duas atrações que ficam na Praça Federation: o Centro Ian Potter da Galeria Nacional de Victoria, que abriga a coleção australiana do museu - de escudos aborígenes a pinturas contemporâneas - e o Centro Australiano de Imagem em Movimento, que mostra a história do cinema (incluindo os primeiros projetores, as chamadas "lanternas mágicas"; as primeiras tentativas de se fazer um filme e a história da TV australiana (em certas partes do país ela só chegou em 1971).

Porém, não há dúvida de que o grande destaque era a área de games, onde os visitantes podem – eu diria devem – jogar "Space Invaders" no velho Atari, bem como versões em fliperama de "Missile Command" e "Super Mario Brothers" nas primeiras versões do Nintendo, e tudo de graça. Para uma dose de seriedade depois de tanta diversão, encerramos a tarde no Santuário da Lembrança, um monumento em homenagem aos veteranos de guerra da Austrália.

  • Seth Kugel/The New York Times

    Santuário da Lembrança é um monumento em homenagem aos veteranos de guerra da Austrália

Aí já era hora do jantar. Esses fins de semana de cem pratas são fáceis em cidades em que os bairros de imigrantes são ricos de atrações e Melbourne é cheia deles. Decidi deixar Chinatown e Little Saigon de lado para conhecer o centro comercial Footscray, de fácil acesso e lotado de uma seleção eclética de restaurantes: etíopes, vietnamitas, sudaneses e chineses. O bairro ainda tem fama de ser "ruim", mas geralmente constato que essa reputação é sempre exagerada.

De fato, todos os medos provaram ser infundados: a área era meio decadente, mas provou ser o paraíso da gastronomia. Era quase impossível escolher um restaurante entre as dezenas de opções, mas acabamos seguindo a técnica do "vamos com a massa" e acabamos no Hung Vuong, uma casa vietnamita de visual moderninho com preços bem acessíveis.

Por si só um lugar como esse já seria um achado, ainda mais na Austrália, onde o imposto já está incluído e não se dá gorjeta. Isso significava que eu podia ser gentil e pagar o jantar dos meus anfitriões! Com entusiasmo, dividimos uma carne apimentada e um pho de porco espetaculares, rolinhos primavera crocantes e sequinhos envoltos em folhas de alface frescas e um frango grelhado saboroso.

Preço total: 28 dólares.

Encerramos a noite no Section 8, um bar escondido numa das vielas mais movimentadas do centro de Melbourne. Elas são uma das características mais agradáveis da cidade, e oferecem de tudo, desde cafés a bares e restaurantes, combinados com arte de rua. Demoramos um pouco para entrar, mas o terraço e a cerveja local a US$ 5,50 valeram a espera. Para encerrar, Wes nos levou ao seu pub irlandês favorito, o lotado P. J. O'Brien's, com música ao vivo, dança e chope Carlton a US$ 8.

Total gasto: 58,35 dólares australianos.
Restante: 47,65 dólares.

Domingo
Ao lado de Wes, Patricia e Diego, um amigo deles, fomos para St. Kilda, bairro bacana à beira-mar no sul da cidade, famoso pelo parque de diversões Luna Park e suas confeitarias tradicionais, à moda antiga, intercaladas com lugares muito bons para o brunch de domingo da rua Acland. Os doces, numa variedade infinita, desafiam qualquer dieta nas vitrines. Lá dentro, uma verdadeira viagem no tempo: numa delas, vimos um grupo de senhorinhas, todas de chapéu e vestidos roxos se divertindo a valer.

  • Seth Kugel/The New York Times

    Festivais são bem frequentes em Melbourne. Na foto, o festival Viva Victoria, que celebra as diversas culturas da cidade

Escolhemos a Acland Cakes porque a oferta de bacon com ovos era excelente e havia doces e bolos que não acabavam mais. (Mal sabíamos nós que íamos nos apaixonar pela nossa garçonete, que me chamou de "garoto levado" quando implorei a ela que acrescentasse o café ao nosso pedido bem depois de ele já ter sido feito.) Decidi abusar e pedi bolo de amêndoas para mim e um bolo à moda florentina para a mesa (o que elevou minha conta para um total de vinte dólares). Sim, um gesto extravagante para quem pretendia ser frugal – mas pouco comprometedor graças a todas as opções de graça que Melbourne tinha a oferecer.

Depois, demos uma volta pela Esplanade Market, a feirinha de artesanato semanal de frente para o mar. Patricia ficou interessada na enorme variedade de pinturas e joias, embora eu tenha ficado mais impressionado com as abotoaduras feitas das teclas do teclado de um Apple antigo.

Em Melbourne, cada fim de semana é marcado por algum tipo de festival, muitas vezes mais de um. Eu cheguei uma semana atrasado para o Festival Gastronômico e do Vinho e uma semana adiantado para o Festival Internacional da Comédia, mas demos uma passada no festival Viva Victoria, que celebra o charme do multiculturalismo da cidade.

Ainda satisfeito do café da manhã, recusei os bolinhos apimentados da Mauritânia, as linguiças polonesas, o frango indonésio e as empanadas chilenas – mas não resisti à chance de tirar uma foto ao lado do Ranger Roo, o mascote dos parques estaduais de Victoria.

Quando a fome finalmente bateu, passamos no supermercado Coles, onde 40 dólares (incluindo os meus últimos dez) compraram mais comida do que o necessário para quatro pessoas: filé de carne de canguru (US$ 15 o quilo), hambúrguer de carne de canguru, material para salada e vinho. Depois, fomos para o parque perto da casa de Wes, um dos vinte espalhados pela cidade que oferecem grelhas de uso público, alguns com belas paisagens às margens do rio Yarra.

Wes preparou os grelhados com a confiança de um homem que sabe mexer tanto com a carne de canguru como com a churrasqueira pública; a carne, assada ao ponto, manteve a textura de um bife malpassado.

Foi uma refeição excelente e, embora tenha me deixado sem um centavo para o resto da noite, Melbourne me salvou com mais uma atração de graça: os pinguins. Voltamos a St. Kilda e caminhamos até o fim do píer, onde eles estavam voltando para casa - e enquanto algumas aves ainda caminhavam nas pedras, para encanto da multidão, apostei comigo mesmo que nenhuma daquelas pessoas trocaria a cena pela visão de um teatro de ópera sofisticado.

Total do domingo: 37,60 dólares.