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Entre o Chile e a Argentina, viagem de barco cruza lagos, vulcões e florestas patagônicas

EDUARDO VESSONI

Colaboração para o UOL, de Porto Varas *

12/05/2011 16h00

Quando o suíço Ricardo Roth morreu, em 1947, deixou um currículo invejável. Já havia percorrido a Patagônia a cavalo, trabalhado com Perito Moreno durante a divisão política de terras entre o Chile e a Argentina, e encabeçado a criação do primeiro parque nacional chileno.

Mas sua aventura mais conhecida (sobretudo entre turistas brasileiros) foi a criação de uma audaciosa travessia pelos lagos de origem glaciar, na fronteira entre aqueles dois países. O que fora apenas uma viagem exclusiva realizada por europeus da época com dinheiro, em 1913, se transformou em um dos roteiros mais cobiçados naquelas terras a mais de mil km de Santiago, capital do Chile.

Conhecida como 'Travessia dos Lagos', essa viagem é realizada em 7 etapas (4 terrestres e 3 lacustres) e pode ser concluída em um único dia ou em dois com um pernoite em Peulla. A princípio, o roteiro soa longo e cansativo. O corpo até reclama, mas o espírito volta em um estado que só aquelas distantes terras frias do sul do continente são capazes de oferecer.

A rota passa por parques nacionais emblemáticos do continente, como o argentino Nahuel Huapi e o chileno Vicente Pérez Rosales, e é uma referência a uma travessia comercial de mais de 400 anos realizada pelos índios huilliches e, anos mais tarde, por padres jesuítas.

Embora seja possível iniciar a viagem em ambos países, a maioria dos passageiros ainda prefere começá-la pelo Chile, em Porto Montt, a capital da Região dos Lagos.

De um lado, estradas de cascalhos com curvas sinuosas que recortam bosques coloridos de 'arrayanes' e alerces; do outro, lagos de águas frias e tranquilas alimentadas por glaciares de eternos picos nevados.

Parece improvável, mas essas geografias fazem parte de um mesmo roteiro e são motivos suficientes para fazer com que o passageiro deixe a cabine interior para encarar o frio congelante do lado de fora.  Afinal de contas, ninguém em sã consciência deixaria passar certos ícones naturais da região.

O primeiro trecho da viagem dura 2 horas e percorre os 76 km entre Porto Montt e Petrohué, já no interior do impressionante Parque Nacional Vicente Pérez Rosales (o primeiro do Chile), onde ainda sobra tempo para visitar os Saltos de Petrohué, quedas d'água de tons, exageradamente, azuis que podem ser vistas sobre passarelas.

A próxima parada é a pequena Peulla, um simpático povoado em que os 120 habitantes vivem, principalmente, do turismo. É ali que passam a noite os viajantes que realizam a travessia em 2 dias (obrigatória durante os meses de outono e inverno).

Dali, a viagem segue por terra em direção à fronteira argentina, em Puerto Frías. Os 27 km são percorridos em 2 horas e abrigam imensas árvores que, nos meses de outono, assumem nostálgicos tons amarelados.

A estrada que serpenteia a região é percorrida sem pressa e o cardápio de cenários inclui florestas patagônicas, cachoeiras e o atrativo mais impactante desse trecho: o Monte Tronador, um gigante de 3554 metros de altura, cujo gelo derretido alimenta e tinge as águas do Lago Todos los Santos. Não é a toa que esse lago é conhecido, turisticamente, como Lago Esmeralda.

Entre um aviso sonoro e outro do guia (que aliás destoam muito da calmaria patagônica daquelas terras que mereceriam um pouco mais de silêncio), o passageiro volta às águas geladas da região. O trajeto seguinte é um dos mais curtos de toda a viagem. São apenas 3 km de silenciosa e emocionante navegação pelo Lago Frías até a minúscula Puerto Alegre.

A essa altura da travessia, quando quase tudo já começa a querer se repetir, o viajante cruza um dos trechos mais belos de todo o trajeto. O barco de dimensões mais modestas singra calado aquelas águas de tons esverdeados, a tripulação é precisa nos avisos pelo microfone e o cenário que se abre diante dos olhos é capaz de silenciar até os grupos de turistas mais agitados.

A experiência é acompanhada de um traslado terrestre de 10 minutos até Puerto Blest, onde os passageiros almoçam no restaurante de uma hospedaria local.

O último trecho marítimo dura  1 hora e tem como destino Puerto Pañuelo, um pequeno porto aos pés da colina que abriga outro clássico da região, o histórico hotel Llao Llao.

A viagem termina com um último traslado terrestre de 25 km até o centro de Bariloche, mas é impossível voltar para casa sem ter deixado ao menos um pedaço da alma guardado em algum canto daquelas terras distantes. O velho Roth deixou o seu: um roteiro que, há quase cem anos, não se cansa de repetir.

SERVIÇO

Cruce Andino

A travessia pelos Lagos Andinos tem saídas diárias de Puerto Montt, Puerto Varas e Bariloche e pode ser realizada em até 2 dias. Porém, durante a temporada de inverno (de maio a agosto), o passageiro deve fazer a viagem, obrigatoriamente, com um pernoite em Peulla, devido às condições climáticas.

www.cruceandino.com

AGÊNCIAS

  • Eduardo Vessoni/UOL

    A travessia pelos lagos andinos inclui vistas exclusivas como a do vulcão Osorno, um dos mais famosos ícones de toda essa região

Aoniken Patagonia
www.aonikenpatagonia.com.ar

TurisTour
www.turistour.cl

Turisur
www.turisur.com.ar

ONDE FICAR

Cabaña del Lago (Porto Varas)
www.cabanasdellago.cl

Galileo Hotel (Bariloche)
www.galileoboutiquehotel.com

Hotel Cumbres Patagónicas (Porto Varas)
www.cumbrespatagonicas.cl

Hotel Natura (Peulla)
www.hotelnatura.cl

Hotel Patagónico (Porto Varas)
www.hotelpatagonico.cl

Llao Llao (Bariloche)
www.llaollao.com

Solace Hotel (Porto Varas)
www.solacehotel.cl

 

* O jornalista Eduardo Vessoni viajou a convite da Lan (www.lan.com) e do Cruce Andino (www.cruceandino.com)