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Resgate no mar e na selva: como é o treinamento dos comissários de bordo?

Os comissários usam um Fokker 100 para treinar evacuação de aeronaves - Marcel Pellegrino/UOL - Marcel Pellegrino/UOL
Os comissários usam um Fokker 100 para treinar evacuação de aeronaves
Imagem: Marcel Pellegrino/UOL

Marcel Vincenti

Colaboração para o UOL

26/03/2017 04h00

Comissários de bordo não são preparados apenas para distribuir refrigerantes e barrinhas de cereais dentro de um avião. Para trabalhar em viagens aéreas, eles precisam ter habilidades que muitos desconhecem. 

Com o objetivo de saber como é a capacitação de alguns destes profissionais, o UOL visitou uma academia de treinamento de comissários em São Paulo, onde os tripulantes da empresa aprendem a lidar com cenários de emergência que podem ocorrer durante um voo.

Nesta maratona, os comissários passam por cursos que os ajudarão a sobreviver e a salvar passageiros em eventuais pousos de emergência e quedas da aeronave.

"Devido à alta segurança da aviação nos dias de hoje, os tripulantes raramente têm que enfrentar situações críticas de emergência a bordo", diz Heverton de Carvalho, coordenador de Treinamentos da Latam . "É por isso que, periodicamente, eles vêm à nossa academia para simular situações que podem colocar suas vidas e a dos passageiros em risco. O objetivo é que eles estejam preparados para preservar a integridade física de todos se algum acidente ocorrer na vida real". 

Esta capacitação é realizada em uma área de 9.000 m² recheada de ambientes que recriam possíveis perrengues de uma viagem aérea.

No meio de um dos galpões da academia, por exemplo, há um Fokker 100 aposentado dentro do qual os comissários são desafiados a mostrar como lidariam com ocorrências de turbulência severa, incêndio a bordo e despressurização da cabine. Neste processo, eles verificam se as máscaras de oxigênio estão funcionando corretamente, aprendem a se locomover na cabine cheia de fumaça (produzida com glicerina) e devem socorrer viajantes (interpretados por outros comissários) que tenham se machucado na turbulência.  

Logo em seguida, eles coordenam a evacuação da aeronave após um suposto pouso de emergência em terra. Aqui, a meta é levar os passageiros ordenadamente até a porta da aeronave e, de lá, fazê-los deslizar pelo escorregador inflável até chegar ao solo com segurança.

Manobras na água e sobrevivência na selva

Ao lado do Fokker 100, existe um tanque com 405 mil litros de água onde os tripulantes simulam o resgate de pessoas após a queda do avião no mar. O processo é minucioso: usando coletes, todos aprendem a como se amontoar com segurança em botes salva-vidas e ganham conhecimento sobre como sobreviver na água caso as embarcações infláveis não possam ser utilizadas.

Uma das técnicas ensinadas é o "caracol", em que os participantes se dão os braços e se enrolam em forma de espiral no meio do tanque aquático. De acordo com o coordenador Heverton de Carvalho, isso os mantém próximos uns dos outros, os ajuda a preservar o calor do corpo e os protege de predadores marinhos. "Ao ver aquela enorme massa humana, tubarões e outros bichos podem pensar que se trata de um animal gigantesco e, por isso, dificilmente irão realizar um ataque".

A hipótese da queda do avião no meio de uma floresta também é considerada. No fundo da academia da Latam, há um pequeno matagal no qual os comissários adquirem técnicas para sobreviver (e fazer os passageiros sobreviverem) na selva. Lá, eles aprendem a usar os destroços da aeronave para montar abrigos sob as árvores, a caçar alimentos em ambientes selvagens e a fazer sinalizações para que os sobreviventes sejam resgatados o mais rápido possível.

E, por falar em resgate, perto dessa área está uma das mais desafiadoras etapas do treinamento. Trata-se de uma casinha que abriga um labirinto: escuro, o local é recheado de fumaça de glicerina e deve ser atravessado pelos tripulantes que, no percurso, têm de encontrar e tirar de lá um boneco que simula um passageiro desacordado. O objetivo desta etapa é preparar os profissionais para evacuar um avião que, após um pouso de emergência, esteja tomado pela fumaça de um incêndio. 

Mais de 4.600 comissários por ano

Além de se prepararem para lidar com situações de emergência, os profissionais que passam pela academia da Latam são capacitados para lidar com aspectos mais amenos de uma viagem aérea, como a realização do serviço de alimentação a bordo.

Deve passar por este centro de treinamento todo comissário recém-contratado pela Latam. E, a cada seis meses, eles voltam ao local para realizar cursos de reciclagem. Em 2016, a companhia promoveu mais de 7.500 horas de treinamento para 4.625 comissários de voo.