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São Miguel do Gostoso é a nova meca dos kitesurfistas no Nordeste

CRIS GUTKOSKI

Colaboração para UOL Viagem, em São Miguel do Gostoso *

11/01/2011 07h00

A combinação de ventos fortes e belas praias de água morna, quase desertas, está fazendo de São Miguel do Gostoso a nova meca dos kitesurfistas e windurfistas no litoral do Nordeste. A pequena cidade fica 108 km ao norte de Natal, a capital potiguar, e tem acesso fácil, pelas rodovias BR-101 e RN-221. No final de 2010 foi inaugurada ali, na praia do Cardeiro, a terceira escola de esportes náuticos, comandada pelo atleta Kauli Seadi, brasileiro que é tricampeão mundial de windsurfe na categoria wave.

As três escolas – Dr. Wind, Escola Gostoso e Clube Kauli Seadi – oferecem cursos para iniciantes ou veteranos no esporte, aluguel de equipamentos e também funcionam como guarderias, espaços para abrigar velas e pranchas.  Devido à posição geográfica privilegiada, ao norte do Estado e numa extremidade leste do litoral brasileiro, São Miguel do Gostoso registra uma prolongada temporada de bons ventos, de cerca de nove meses por ano, a partir de setembro. A presença de esportistas estrangeiros e de várias partes do Brasil trouxe novos sotaques e atividades à antiga vila de pescadores, um lugar tranquilo onde até poucos anos atrás as únicas velas no mar eram as dos jangadeiros.

Aberta em 2007, a primeira escola, a Dr. Wind, é de um italiano que desde o final da adolescência surfava nas Ilhas Canárias. Instalado na praia da Ponta do Santo Cristo, atualmente a parte mais colorida e agitada da cidade graças aos praticantes dos esportes, Paolo Migliorini diz que a velocidade média dos ventos na região é de 18 a 24 nós e, em dias excepcionais, pode chegar a 35 nós. Tornou-se comum, por exemplo, ouvir kitesurfistas pedindo para aprontar “kite de nove”, ou equipamento de nove metros quadrados de vela, uma pipa para ventos fortes.  Para aprendizes, a escola de Paolo dispõe de cursos de quatro e seis horas, sendo duas horas por dia.

  • Cris Gutkoski/UOL

    O velejador italiano Paolo Migliorini, pioneiro nas escolas de kite e windurfe em São Miguel

O kitesurfe é um esporte radical: os praticantes literalmente voam sobre as ondas, de prancha nos pés, suspensos pela vela que o vento infla e carrega.  A modalidade mistura manobras de surfe, windsurfe, wakeboard e vôo livre. A tribo de kitesurfistas em São Miguel do Gostoso reúne de adolescentes a sexagenários, com raras mulheres no grupo. Alguns se lançam no mar de óculos escuros e capacete, já que a prancha, quando se solta dos pés, pode ser lançada contra o corpo do velejador. O windsurfe se revela menos arriscado, mas exige mais força nos braços, especialmente com uma ventania daquelas.

“O windsurfe só é radical se você é radical”, diz Eugênio Henrique Schmidt, gerente do Clube Kauli Seadi e novo morador da cidade potiguar. Paulista, Eugênio trabalhou na primeira escola do tricampeão mundial, em Ibiraquera, Santa Catarina. Sobre pranchas largas, uma primeira aula de windsurfe ensina a identificar a direção do vento, a manter as pernas na posição correta, a erguer e manobrar a vela e a se equilibrar sobre as ondas. Parece fácil e, mesmo que não seja, aprende-se também que esportes no mar envolvem riscos. Nos finais de semana, as dezenas de velas de kite e winsurfe que partem da Ponta do Santo Cristo mostram que o prazer e a adrenalina do contato com a natureza falam mais alto do que o medo de despencar na água.

“Eu gosto do silêncio no mar”, resume Paolo. “Esse esporte não polui, só usa a força do vento”. E que força. Foi um velejador italiano, conterrâneo do pioneiro da Dr. Wind, que fez a provocação que faltava para que o dono de restaurante André Gugelmin começasse a praticar o esporte:  “Você tem a Ferrari e não tem a chave?” A Ferrari se compara à qualidade do lugar, uma combinação especial de praias com grandes faixas de areia, águas claras e cálidas, emolduradas pela muralha verde dos coqueiros sempre sacudidos pelos ventos. Um esporte náutico permite ver e vivenciar uma paisagem dessas de ângulos espetaculares, aéreos, inclusive. Vindo do frio de Curitiba, André Gugelmin, dono da pizzaria e batataria Spaço Mix, um point noturno, aprendeu a velejar e usa intervalos da hora do almoço para aprimorar as manobras no kitesurfe. “Agora temos a Ferrari, a chave, a escuderia, tudo”, diz.

Município de 10 mil habitantes, São Miguel do Gostoso tem esse nome excêntrico em homenagem ao “seu Gostoso”, um antigo morador que hospedava viajantes em casa e sempre tinha causos para contar. Ao final das sessões noturnas, num tempo anterior à energia elétrica,  ele sempre ria mais do que os outros, e ficou conhecido como “o homem da risada gostosa”. A cidade se emancipou da vizinha Touros com o nome de São Miguel de Touros, mas, em plebiscito, votou pela memória de um contador de histórias de grande humor e longa fama.

Junto dos esportes e do relax em pousadas equipadas com piscinas, ofurôs, redários, mirantes e bibliotecas, quem gosta de comida e bebida também encontra a sua praia em Gostoso. Já existe até um restaurante de cozinha mexicana à beira-mar, o Jardim do Seridó, comandada por Rogério Brant, kitesurfista e aprendiz do chef californiano James Halper na praia de Pipa. O guacamole que acompanha burritos, nachos, quesadillas e tortilhas leva uma dúzia de ingredientes, entre eles gengibre e açúcar mascavo.  Na praia do Cardeiro, camarões e outros frutos do mar podem ser degustados em cenário de hotel-fazenda, no Mar de Estrelas. Os cajueiros formam a comissão de frente do pátio, mas ele abriga também pés de umbu, araçá, goiti, limão, laranja, graviola, açaí, goiaba, pitanga, seriguela, araticum etc.

  • Cris Gutkoski/UOL

    A festa das pipas em São miguel do Gostoso, meca de kitesurfistas e windsurfistas

No Hibiscus, de visual romântico à noite, à meia-luz, o cardápio contempla quitutes baianos como acarajé e bobó de camarão e invenções da cozinha contemporânea como o filé de peixe com crosta de gergelim, especialidade também do restaurante Xique-Xique, da Pousada dos Ponteiros, à beira-mar, que serve ótimos coquetéis com sorvete: o Praia do Santo Cristo, em reverência à orla preferida dos velejadores, leva vodka, sorvete de morango, Curaçao blue e abacaxi. A 12 km do centro, na bela enseada da Ponta de Tourinhos, a pernambucana Iara Félix prepara risotos de camarão ou polvo e apresenta criações dela como risoto de caju ou manga. Pratos da cozinha tipicamente nordestina como o escondidinho de camarão e o arrumadinho com carne de sol, macaxeira, feijão verde, farofa e vinagrete estão no cardápio do Eskina Brasil, no centro da cidade. 

Os finais de semana trazem dois eventos gastronômicos: a feijoada na Pousada Casa de Taipa, no almoço de sábado, para hóspedes e público em geral, acomodados em frente ao jardim numa varanda em que mesas e paredes são quadros de cores vivas do artista Kiko Prado, e a feira de pequenos produtores rurais das segundas-feiras, a partir das 7h. A rua ao lado da Igreja de São Miguel Arcanjo fica tomada de barracas de manga, caju, abacaxi, banana, mamão, carne bovina, suína, roupas, artesanato e eletrodomésticos. Desde cedo, come-se tapioca com guisado e bebe-se café ou cachaça. É possível nem reparar, porque o mar está a três quadras de distância e as velas ainda estão recolhidas, mas olhando bem kitesurfistas e windsurfistas também circulam pelo caos da feira de chinelo e bermudas, são os donos ou funcionários de pousadas e restaurantes, escolhendo as melhores frutas e legumes para mais uma semana deliciosa em São Miguel do Gostoso.

SERVIÇOS

Clube Kauli Seadi
Tel: (84) 9190-7017
www.clubekauliseadi.com

Dr. Wind
Tel: (84) 9981-0583
www.drwind.com.br

Escola Gostoso
Tel: (84) 9102-7686
www.escolagostoso.com

Aqui se Faz Gostoso – Guia de Pousadas e Restaurantes
www.aquisefazgostoso.com.br

 

 *A jornalista Cris Gutkoski viajou a convite da Pousada dos Ponteiros