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Como aproveitar um fim de semana em Paris com US$ 100

Bicicletas do Vélib", sistema de compartilhamento público de bicicletas de Paris - Alice Dison/The New York Times
Bicicletas do Vélib', sistema de compartilhamento público de bicicletas de Paris Imagem: Alice Dison/The New York Times

SETH KUGEL

New York Times Syndicate

14/03/2011 08h00

Certa noite de sexta-feira em janeiro, eu estava assistindo uma banda do Norte da África chamada Daxar se apresentar na casa de world music Satellit Café, em Paris, e pensei em tomar uma cerveja. Quando a banda concluiu sua versão magrebiana de “Paint It Black” dos Rolling Stones (“Vocês conhecem esta?” perguntou timidamente o líder da banda. “Não é nossa”), eu decidi que não. Um luxo desses poderia me custar a entrada no Louvre no domingo ou um vinho no almoço no sábado.

Eu estava tentando passar um fim de semana em Paris com apenas US$ 100, e isso significava abrir mão da cerveja – e do Louvre e do vinho no almoço também, como viria a descobrir. Mas quem precisa de cerveja quando tem uma banda legal para ouvir? Quem precisa do Louvre quando há o gratuito e fascinante Musée Carnavalet? E quem precisa de vinho quando tem um suculento confit de pato em seu paladar?

Ainda assim, Paris é um local difícil para ser econômico. Assim como em meu fim de semana com US$ 100 em Nova York, e excluí o custo da hospedagem – desta vez eu dormi na casa de um amigo de um amigo perto da Bastilha – mas tudo mais contou, da passagem de metrô até a aspirina que achei que precisaria para combater a ressaca do vinho que acabei ficando sem dinheiro para comprar.

No dia em que cheguei, US$ 100 eram precisamente 74,29 euros. Eu planejei até os centavos, usando ideias de amigos e leitores, e mergulhando profundamente no guia “Paris Pas Cher” (cuja tradução é “Paris barata”, ou talvez “Paris nos passos da Cher” – me desculpe, mas meu francês anda meio enferrujado). O que surgiu foi um itinerário divertido, mas com surpresas que mantiveram o fim de semana, bem, animado.

Sexta-feira

A primeira surpresa foi agradável: um novo amigo chamado Yoann, que me ajudou a pronunciar “pinte” enquanto eu pedia uma cerveja de 3,80 euros no Le Megalo, um dos bares lotados com ofertas de happy hour na região da Bastilha. Outros se juntaram à nossa conversa – sobre os sistemas públicos de saúde francês e americano – me permitindo esticar minha bebida solitária por tanto tempo que me atrasei para o show (couvert, 10 euros) no Satellit. Eu saí correndo, pegando um crepe de presunto e queijo por 5,50 euros na esquina enquanto estava a caminho.

Sábado

O horário mais fácil de manter o orçamento na França é no café da manhã. Eu fui até uma padaria na esquina (e em Paris sempre há uma padaria na esquina) para pedir um croissant au beurre (0,90 euro) para comer na hora e uma baguete de 0,90 euro para levar comigo.

  • Alice Dison/The New York Times

    Em Paris sempre há uma padaria na esquina: pedi um croissant au beurre (0,90 euro) para comer na hora e uma baguete de 0,90 euro para levar comigo

Eu esperava que meu transporte seria o sistema de compartilhamento de bicicletas de Paris, o Vélib’. Um euro permite o uso de qualquer bicicleta de suas estações ubíquas por períodos de 30 minutos por vez e você pode devolver a bicicleta em qualquer estação. Dessa forma eu poderia percorrer a cidade para ir a um museu gratuito, almoçar, parar no Musée d’Orsay, então aguardar na fila pelos ingressos na ultratradicional Comédie-Française.

Mas a ideia da bicicleta não deu certo. Eu sou americano demais, apesar de não aparentar: na minha carteira. As bicicletas Vélib’ necessitam de depósito de cartão de crédito e as máquinas no local só aceitam cartões com chip. Todos os meus cartões eram com faixas magnéticas, tão arcaicas na Europa quanto pés e polegadas.

Caminhar não me levaria muito longe; agora eu precisaria tomar o metrô, a 1,70 euro a viagem. Adeus domingo no Louvre.

Eu caminhei até o Musée Carnavalet, situado em duas mansões históricas no Marais, a 20 minutos a pé da minha casa temporária. Entre as dezenas de museus gratuitos operados pela prefeitura, o museu oferecia uma ampla visão do passado da cidade, contada por pintores de época e recriações históricas. Foi criativo e decididamente não enfadonho. Mas a melhor parte de tudo foi a exposição de placas. No passado, quando os índices de alfabetização em Paris eram mais baixos, as empresas tinham que criar placas que diziam o nome do estabelecimento em imagens. Entre os destaques: um gato preto de aparência assustada em uma lua crescente, do famoso cabaré do século 19 Chat Noir, em Montmartre, e as imensas tesouras de uma alfaiataria.

Então chegou a hora de almoçar com uma ex-colega com quem conversava muito por e-mail, mas com quem nunca me encontrei pessoalmente. Mildrade Cherfils. Ela me levou a um bistrô bonitinho chamado Cave La Bourgogne, no 5º Arrondissement. Ela disse que eles serviam uma salada tão grande por 10 euros que me manteria satisfeito até o jantar, mas quando ela pediu o confit de pato, eu acompanhei. A sedutora perspectiva de um pato em toda sua glória crocante e gordurosa, com batatas também crocantes, era demais. Ele atendeu minhas expectativas, apesar de nós dois termos ficado com inveja do casal francês ao nosso lado, que também pediu o confit – acompanhado de uísque e vinho.

Eu me despedi de Mildrade e corri para o Musée d’Orsay, o grande templo parisiense de arte que fica situado em uma grandiosa ex-estação de trem. No piso térreo, estátuas clássicas nas poses mais maravilhosamente aleatórias se misturam livremente com os visitantes, que fazem suas próprias poses interessantes. Uma cena em particular me arrebatou: a escultura de Charles DeGeorge do século 19, “La Jeunesse d’Aristotle”, uma imagem em mármore do filósofo lendo pensativamente, enquanto logo atrás dela um jovem loiro de carne e osso fazia uma pose virtualmente idêntica, enviando uma mensagem de texto.

O museu fechou às 18h e então eu atravessei correndo o Sena para entrar na fila para os ingressos da Comédie-Française, que ficam disponíveis uma hora antes de cada apresentação. Ao chegar duas horas antes do horário (para “As Três Irmãs” de Chekhov), eu era o primeiro da fila, pronto para combater o tédio com um livro.

  • Alice Dison/The New York Times

    Musée d’Orsay, o grande templo parisiense de arte que fica situado em uma grandiosa ex-estação de trem

Não foi preciso. Eu logo estava acompanhado de três maravilhosas companhias, incluindo uma jovem de 25 anos de rosto radiante chamada Nadège. Nós conversamos sobre política, arte e sobre o trabalho interessante de Nadège no escritório administrativo de Notre Dame. Após duas horas resgatando o francês há muito perdido no meu cérebro, eu imaginei que teria uma pequena chance de entender a peça, especialmente por tê-la lido no colégio. Sem chance, mas meu lugar por 5 euros na primeira fila do segundo balcão foi maravilhoso para observar a plateia e apreciar o ambiente, já que não dava para ver a peça em si; eu estava tão distante à esquerda do palco que não conseguia ver mais do que 20% da ação (incompreensível) sem entortar meu pescoço.

Domingo

Meu assento na peça ficava ao lado do de Nadège – felizmente, já que ela acabaria se oferecendo para me mostrar o Marais no dia seguinte.

Nós começamos com um almoço barato no Chez Papa, uma pequena rede de Paris que serve pratos do sudoeste da França, onde pedi uma salada “colossal”, coberta com presunto e batata (e com um jarro de água) por 10 euros, deixando 2,12 euros do meu orçamento. Nós começamos a andar, mas fomos atraídos para o Le Temps des Cerises, um bistrô em um sobrado cujo exterior envelhecido, bar de zinco e mesas de madeira rústicas nos encantaram. “Parece que estamos em outro tempo”, disse Nadège, cantando junto as canções antigas que saiam dos alto-falantes enquanto eu gastava meus últimos dois euros em um café.

Então partimos para Notre Dame, para um concerto gratuito às 16h de um organista de Caen. A música foi ótima, se música de órgão é o seu lance. (Não é o meu.) Mas o preço foi ótimo e eu fiquei feliz em relaxar, ficar olhando e me maravilhando, não apenas com os arcos góticos impossivelmente altos e com os vitrais complexos, mas também em quanto consegui ver, fazer e comer na cidade com uma verba apertada. Haveria muitas outras oportunidades para tomar vinho.