17/03/2010 - 19h50

Gramado, no RS, vira a terra dos coelhos em época de Chocofest

Depois das renas, chegaram os coelhos. Para o inverno são aguardados os artistas e os cinéfilos. Em Gramado, cidade a 115 km de Porto Alegre, cada estação do ano é festejada com visitantes ilustres. Nesta Páscoa, o festival do chocolate, a Chocofest, teve início em 5 de março e prossegue até 4 de abril, com atrações em diversos pontos da cidade. Entre as principais novidades estão um desfile de rua com 220 integrantes, a Parada de Páscoa, um chocolate da tarde servido para as crianças por um simpático casal de coelhos e a confecção de roupas e acessórios de chocolate, que serão exibidos em desfiles e numa vitrina refrigerada na praça Major Nicoletti. Como os bombons, vestidos de leite, manteiga e cacau são arte perecível.

Público acompanha apresentação de coelhos no palco da Rua Coberta, em Gramado, durante a Chocofest

A exemplo do que acontece nas semanas do Natal Luz, a cidade da Serra Gaúcha ganha uma decoração especial. Esculturas de coelhos de várias cores e tamanhos ocupam os canteiros da avenida Borges de Medeiros e as chamadas rótulas, os pontos de circulação de veículos. Mas são os coelhos que caminham, brincam e abraçam os visitantes as grandes estrelas da festa: os coelhos com gente dentro, atores e recreadores vestidos com máscaras gigantes e peludas, solicitados para fotos a todo instante, por crianças e adultos. São bonecões fofos, de 2 m de altura, para afagar ao ar livre. Em Gramado, o festival do chocolate é também um festival de abraços.

Ovos de todos os tamanhos e preços nas vitrines de Gramado

Um diálogo entreouvido de turistas de Minas Gerais no primeiro sábado da Chocofest ilustra o espanto com a novidade da programação:
- De tarde vai ter desfile ali na avenida das Hortênsias.

- Legal. Desfile de quê?
- De coelhos.
- O quê?!?

Já faz parte da paisagem da cidade serrana este clima planejado de contos de fadas. Ali a Aldeia do Papai Noel, um parque temático com duendes e pinheiros alemães, fica aberto todos os meses do ano, o museu do Minimundo expõe uma adorável Europa de brinquedo e ninguém se espanta mais com bonecos de neve decorando o inverno brasileiro. Em 2010, a Chocofest retorna a Gramado depois de anos sendo realizada em pavilhões de Canela, a cidade vizinha, sede do Festival Internacional de Teatro de Bonecos há duas décadas. Nos dois polos turísticos do Sul do país, ver seres mágicos botando o bloco na rua faz parte do calendário.

Na Parada de Páscoa, realizada aos sábados, às 16h30, não desfilam apenas coelhos. São oito alas e carros alegóricos, reunidos sob o tema "Um Chocoamor à Terra", que prega a preservação dos recursos do meio ambiente. O tema da sustentabilidade inspira oficinas da Chocofest na Rua Coberta, onde crianças fazem brinquedos com garrafas de plástico reciclável. Durante o desfile, centenas de moradores e turistas, acomodados em cadeiras (com ingresso pago) ou em pé nas calçadas, aplaudem jovens skatistas vestidos com máscaras de coelhos, coelhinhas bailarinas, crianças vestidas de vaquinhas, abóboras com rodinhas, capoeiristas, bruxas, palhaços e personagens da literatura universal. O pelotão dos coelhos gigantes pisa o asfalto com as enormes pantufas de pelúcia ao final do desfile, carregando bandeiras. A exceção é Conde Guloseima, o anfitrião de grandes orelhas brancas furando o chapéu, que nos 31 dias da festa circula em Gramado com motorista num Impala conversível de 1961, relíquia cedida pelo Museu do Automóvel Hollywood Dream Cars.

A cidade possui dezenas de lojas de chocolates artesanais. Segundo a Achoco (Associação dos Chocolateiros de Gramado), a produção das fábricas locais para o período de Páscoa, iniciada ainda em outubro, é da ordem de 1.300 toneladas de chocolate, ou metade da produção anual da cidade. Em geral, os ovos são os itens mais procurados. A marca Caracol, por exemplo, vende ovos de 30 g a 3 kg, nas variedades puro, ao leite, trufado, cookies, com licor de cereja, com crocante de flocos e o Spoleta, que tem esse nome porque produz estalos na boca, quando um açúcar especial entra em contato com a saliva. A lista de bichos de chocolate é grande: além dos coelhos, tem galinha, urso, pintinhos na casca do ovo, cachorro, dinossauro etc. Nas lojas da marca Lugano, super-heróis, Bob Esponja e Shrek também têm sabor de cacau. E existem ainda os exóticos: chocolates com formato de chuteira, cuia de chimarrão, celular, Kikitos (o troféu do Festival de Cinema).

Os desfiles e exposição de roupas e acessórios de chocolate começam em 20 de março, na Rua Coberta e no espaço Senac da praça Major Nicoletti. A partir de 27 de março e até o domingo de Páscoa, a Chocofest ganha tons mais solenes com o Gramado Aleluia. O Ofício das Trevas se realiza na Igreja Matriz de São Pedro, e a Procissão dos Passos, inspirada na cultura espanhola, vai reunir centenas de pessoas na avenida Borges de Medeiros na noite de sexta, 2 de abril. Atores em sete carros alegóricos vão representar a Via Sacra.

Também no final de março, a partir do dia 25, a cidade de Nova Petrópolis, a 35 km de Gramado, convida os chocólatras a conhecer o Fabuloso Labirinto do Chocolate, construído no Centro de Eventos. A estrutura interativa conta a história da descoberta do chocolate pela antiga civilização maia.

As crianças são certamente o público mais paparicado da Chocofest. Foi para elas que o "dia do coelhinho" foi multiplicado por 30, prolongando-se pelo mês inteiro que antecede o domingo dos presentes de Páscoa. A maioria dos espetáculos, os personagens e a trilha sonora da Parada de Páscoa, as oficinas e contações de histórias na Rua Coberta são para as crianças. No Chocolate da Tarde com a Sra. Coelha, os convidados são acomodados em mesa e cadeiras cujo tamanho lembra o de Branca de Neve e os Sete Anões. Um casal de coelhos, interpretado pelos atores Regina Peres e Júlio Kraemer, apresenta a decoração da sala e explica para as crianças as vantagens de comer cenoura - faz bem para a pele e os pelos, no caso deles.

Uma pose com Conde Guloseima, o mestre de cerimônias da Chocofest, em Gramado

Na estréia do evento, o Sr. e a Sra. Coelho, e a ajudante Cenourete, foram surpreendidos por crianças bem-informadas, que sabiam que a origem do chocolate está na ancestral cultura indígena da América Latina, e não na história dos tataravôs dos coelhos. Tem até hora da reza no chocolate da tarde, para agradecer "o chocolate nosso de cada dia", antes de saborear os bolos com granulados mágicos. Produção do grupo de teatro Artigos, de Canela, o programa tem entrada paga, dura cerca de meia hora e gera situações de puro encantamento, na interação dos pequenos com os improvisos dos atores-coelhos.

A poucos passos da casa da Sra. Coelha - uma casa branca de verdade, cedida pela moradora Odete Balzaretti - adultos podem se deliciar com bebidas fortes servidas no café da marca Prawer. O chocolate quente Bariloche leva conhaque e chantily, o café Velha Bruxa tem gema de ovo crua e há ainda opções com conhaque flambado, licor de cacau e rum com gemada. Um pouco de bebidas destiladas aquece a alma e o corpo no outono que pode ser frio em Gramado, e ainda encoraja os mais tímidos a entrarem naquela loja de artesanato para, enfim, comprar um diadema com reluzentes orelhas felpudas. E desfilar com elas pela avenida principal.

Se a fantasia está nas ruas, de segunda a domingo, não custa entrar na onda das crianças. Nunca viu um coelho de 2 m descer do automóvel conversível com movimentos gentis e bengala de conde? Pois é a hora e o lugar. São raros os lugares do mundo onde o visitante abraça coelhos fofos e veste orelhas brancas a fim de se sentir mais integrado à paisagem.