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Conheça Felicity, nos EUA, a cidade de dois habitantes no "centro do mundo"

Felipe Floresti

Do UOL, em São Paulo

30/03/2015 15h45

Não é tão difícil chegar ao centro do mundo. Basta ir até Yuma, no estado americano do Arizona, e seguir pela rodovia interestadual 8 até Felicity, uma cidade com dois habitantes em meio ao deserto de Sonora, na Califórnia. Lá é considerado oficialmente o Centro do Mundo, pelo menos para as autoridades do Imperial County, condado em que está inserido, e do governo da França (!?). Esse papo todo estranho condiz bem com o que é Felicity e seu criador, o antigo paraquedista francês Jacques-André Istel.

Entre os muitos feitos do francês, conhecido por disseminar o skydiving nos EUA, ele escreveu um livro infantil no ano de 1985 chamado “Coe, the Good Dragon at the Center of the World” (algo como “Coe, o bom dragão no centro do mundo”). Um ano depois, resolveu tirar o Centro do Mundo do papel e criou uma cidade em meio ao deserto chamada Felicity, nome de sua esposa. 

Uma pirâmide guarda uma placa de bronze que indica o lugar exato do centro do mundo. Mas se fosse um metro, ou 50 km para o lado, pouco faria diferença. Em sua lógica, por o planeta ser uma esfera quase perfeita, o centro do mundo (ou do universo) pode ser em qualquer lugar. "Pode ser em seu bolso", como Istel mesmo diz. Em maio de 1985 entrou com o pedido junto à administração do Imperial County para dar ares de oficial à sua reinvindicação. Em 1989, foi a vez do Instituto Nacional de Geografia do governo da França entrar na brincadeira e reconhecer Felicity como o centro do mundo. 

Felicity posa em frente aos painéis de granito que registram a história da humanidade. Ao fundo, a igreja no ponto mais alto da cidade - Felicity/Divulgação - Felicity/Divulgação
Felicity posa em frente aos painéis de granito que registram a história da humanidade
Imagem: Felicity/Divulgação

Mas que autoridade tem esse francês para conseguir tudo isso? A autoridade que tem o prefeito da cidade, em uma eleição realizada 30 anos atrás, em que ganhou 100% dos votos válidos, de sua esposa Felicity e de si próprio. Oficialmente, a cidade de duas pessoas é reconhecida como Comunidade Não-incorporada, ou seja, que não precisa atender às regras do município ao qual deveria pertencer. 

A gestão aparentemente permanente e irrevogável do prefeito de Felicity tem garantido melhorias para a cidade e seus dois moradores. Ao longo dos 30 anos, diversas construções chamam atenção. É o caso de um relógio solar com pouco mais de quatro metros em que o ponteiro é uma réplica de bronze em três dimensões do braço de Deus pintado por Michelangelo no teto da Capela Sistina. O relógio, porém, só marca a hora certa uma vez por ano, ao meio-dia do Natal. 

Em uma das extremidades da cidade fica a Colina da Oração. É um monte feito com 150 mil toneladas de terra sobre o qual fica a igreja. É e, segundo as autoridades locais, continuará sendo o ponto mais alto da cidade. Já na entrada do município, a atração é uma escada espiral que leva a lugar nenhum que um dia pertenceu à Torre Eiffel, em Paris. 

A pirâmide marca o local exato do centro do mundo, fato reconhecido pelo condado californiano em que fica e pelo órgão oficial de geografia do governo Francês - Felicity/Divulgação - Felicity/Divulgação
A pirâmide marca o local exato do centro do mundo, fato reconhecido pelo condado californiano em que fica e pelo órgão oficial de geografia do governo francês
Imagem: Felicity/Divulgação

Um dos motivos de orgulho da população felicitiana é o correio. Existe uma agência exclusivamente dedicada à cidade, que tem no número 92283 seu código postal. Inaugurada em 5 de dezembro de 1987, a cerimônia contou com a participação do cônsul chinês Zhou, que fez um discurso em sua língua natal.

Para finalizar as excentricidades da pujante Felicity, o seu projeto mais ambicioso. Na praça do Centro do Mundo, painéis de granito registram toda a história da humanidade, desde a primeira contagem de números, passando pelas pirâmides do Egito, os gregos, as grandes navegações, civilizações primitivas, até os dias de hoje, encravados em pedra. Istel estima que durante os próximos 4.000 anos, quem quiser saber mais sobre a história de todos os tempos, pode dar uma passadinha em sua cidade. Agora Felicity quer o reconhecimento como Patrimônio da Humanidade pela Unesco.